Bolha

Porque a minha história não podia ficar sem pontuação...

sexta-feira, abril 28, 2006

Só nevoeiro...

É uma benção ser taralhoca, uma verdadeira dádiva ter a memória de um mosquito amnésico que apenas recorda vagamente o que aconteceu nos cinco minutos imediatamente anteriores, sempre e quando esses minutos tenham envolvido géneros alimentícios de fazer arrepiar um nutricionista mais sensível.
Querida memória de curta duração, quem se não tu para apagares os vestígios das figuras ridículas em que constantemente tropeço.
Eu posso calçar o saltinho, vestir o casaquinho cintado e parecer muito selecta, mas mais cedo que tarde o meu verdadeiro eu barraqueiro emerge e vai reputação, vergonha e até integridade física desta para pior.
Ainda ontem (sim, curiosamente ainda não me esqueci) estava quase a passar por criatura civilizada, quando um gesto brusco arruinou o esforço de largos minutos de conversa de ocasião.
Gesto brusco da esteticista, a inconsciente, que me levantou a perna sem pré-aviso depois dela ter estado sossegadita naquela posição até "fossilizar". Foi tal a guinada que ía caindo da chaise longue para fora e quase me esquecia dos choques que tinham precedido o sucesso.
Choques, um laser dá choques! Uma depilação definitiva é "chocante"!!! E a mim deu-me um ataque de riso. 50 disparos dá muita gargalhada. Isto começou logo a levantar suspeitas à esteticista quanto à minha seriedade. Quando cá a "rinhosa" praticamente se atira do sofá abaixo, não lhe restaram dúvidas! Nem podiam restar, porque a minha linda figura acabava com elas. "Notícias da beira: um voo picado quase vitimou jovem (cof, cof) que na altura não envergava calças." Exactamente, sem calças mas de botinha bicuda. Só faltava o chicote! Se por acaso calho a partir uma perna escandalizava também os homens do INEM!
Enfim, a erradicação dos pêlos é uma boa causa, vale bem um ou dois momentos embaraçosos...

Mas não contente e já recomposta estive à beira ter mais uma saída para esquecer à velocidade de TGV. Afirmações tão banais como "agora não se exponha ao sol durante uma semana" despertam os meus instintos mais despudorados e um "pois concerteza, esta semana não há perna escanchada e pachacha ao sol para ninguém!" esteve pendurado desta boca rota para fora. Era mais um episódio para... apagar.

Se não fosse a minha memória (a falta dela) como poderia eu sair à rua? A lembrança de barracas passadas e a certeza de escândalos futuros fariam de mim uma eremita.

Inevitavelmente esqueço-me também das coisas boas, mas essa deixam um bom sabor de boca. E tenho sempre a camarada folha de papel. Para me lembrar de que já fui feliz, mesmo quendo não havia merenda envolvida.
As catástrofes sociais também lá estão. Mas a expressão "virar a página" deve ter tido a sua origem num qualquer antepassado pouco discreto e desafortunado de "je"!

quarta-feira, abril 19, 2006

Velhos são os...

Trapos.
Os trapos e eu!
Já informei a St. Casa da Misericódia para que vá reservando uma camita para mim no lar, vou contactar a Bailaroska para que trate dos preparativos para a disposição de última vontade do meu parco pecúlio e já estou de olho numa dentadura sexy.
É o que me resta depois da macabra descoberta da semana passada.
Regressada do cabeleireiro com menos 20kg de pontas espigadas caí na asneira de ir confraternizar com o espelho. Há uma canção a este propósito e dedicada à minha pessoa que, a lhe ter dado ouvidos, me teria evitado mais este desgosto. Mas como faço questão de não seguir os conselhos que me dão, sobretudo se forem cantados, dei por mim estupefacta a contemplar o meu 1º cabelo branco!
E fui verdadeiramente taralhoca porque em vez de o deixar lá sossegadinho e poder continuar a alimentar a convicção que se tratava só de um cabelo mais loiro que os outros nascido na minha madeixa tresmalhada, fiz questão de o arrancar (sim, eu sei que agora vai nascer uma ninhada) e confirmar que às vezes era preferível ser daltónica. Matei a dúvida, matei a esperança. Maldito espírito científico!!! Mas porque é que eu não saio à minha mãe, que só aos 50 os vê aparecer?!?! Fiquei só com o mau feitio e muita inveja para destilar.

PS: Atenta a minha nova condição, passei a ser ignorada pelos homens das obras (ou talvez não), mas sou digna de um segundo olhar dos reformados, a praga dos bancos de jardim que ocupam qual tartarugas ao sol. Não há como destapar o pescoço (a Primavera ainda não permitiu maiores leviandades) e começar a ficar russa para cair nas boas graças!!

terça-feira, abril 11, 2006

Nem...

... muito balofa, nem pau de virar tripas.
Nem anjo caído, nem demónio à paisana.
Nem monumento, nem espanta pássaros.
Nem nobel em potência, nem estúpida remediada.
Nem escadote, nem bancada.
Nem encarnação da preguiça, nem paladino da diligência.
Nem miss simpatia, nem funcionário público.
Nem poço de silêncio, nem grafonola.
Nem alegria da festa, nem cara fechada.
Nem patrão, nem capacho.
Nem estrela, nem eclipse.
Nem muito, nem pouco.

Diz-se que no meio está a virtude.
Eu digo que no meio está o que não deixa memória.
No meio fica o esquecimento.