Bolha

Porque a minha história não podia ficar sem pontuação...

quinta-feira, maio 27, 2010

Às vezes - vezes a mais - dou por mim cheia de saudades dos meus antigos vizinhos de baixo.Da simpatia da D. Rosa e até das trombas da filha dela.
Porque por grandes que fossem as trombas não chegavam às unhacas dos pés do curioso e simpático hábito que têm os meus vizinhos actuais de abrir as goelas um ao outro às duas da manhã.
Aquilo é que é amor. Aquilo sim é educação. Aquilo são realmente vozes potentes. Tudo a lindas horas... Chamemos-lhe modernices e não maus-tratos, porque ninguém fica a dever piropo a ninguém.
Mas não é só do silêncio que sinto saudades, é também do Dic.
Desde que sou gente e até bem entradota na adolescência o Dic sempre fez parte do andar de baixo.
Não era mobília, não era o filho mais novo, era o cão da casa.
Manchado como um dálmata, maior que um perdigueiro, era o cão mais fixe da vizinhança.
Tinha estilo, simpatia e um ar gingão. Que só perdia quando via a minha irmã agarrada a um "Pé" da Olá. Aí tranformava-se em cachorro irrequieto e só lhe passava a panca quando a minha irmã lhe "cedia" o Pé.
Mas perdoava-se-lhe a queda para os gelados, porque de resto era de refinada educação. A minha infância só lhe ouviu o latido duas ou três vezes. Fosse na rua, fosse em casa, o Dic não ladrava. Nem era preciso. Fazia-se notar.
Não foram nem uma, nem duas, nem três vezes, que alguém veio tocar à nossa porta, ou tocou lá em baixo no intercomunicador para que fizessemos o especial favor de ir até à porta do prédio porque estava lá especado um cão enorme a querer entrar ou sair.
Sim, o Dic tinha outra peculiariedade. O Dic não era passeado, passeava. O dono abria a porta de casa e o Dic ia à sua vida. Se a porta do prédio estava aberta óptimo, se não esperava que chegasse algum vizinho para a abrir. Quando estava despachado das suas voltas regressava e esperava refastelado do lado de fora do prédio que, uma vez mais, um vizinho aparecesse. Depois subia até à porta de casa, dava-lhe uma patadinha e aguardava que se voltasse a abrir.
À medida que eu ia ficando com borbulhas na cara o Dic ia ficando com pêlos brancos no focinho.
E começou também a ficar esquecido. Um dia, já passada a era das borbulhas, reinando os dias do mau-feitio, sentimos alguém arranhar na nossa porta. Quando abrimos era o Dic. Olhou para nós, baixou os olhos desolado e desceu um andar.
Pouco tempo depois ficavamos sem mascote no prédio.
Alguns anos mais tarde trocávamos de vizinhos de baixo.

Sim, tenho saudades dos meus vizinhos de baixo. De todos eles. Da D. Rosa, da tromba da filha dela e sobretudo do Dic.

3 Comments:

At 01 junho, 2010 13:37, Blogger bailaroska said...

Que lindo! (a parte do Dic, não dos teus actuais vizinhos, que já tive o desprazer de conhecer às tantas da manhã...)

 
At 01 junho, 2010 20:44, Blogger Cisne branco said...

Gente bem comportada essa! Eu quando ouço os meus, se não é o filho a correr em casa, é o pai aos berros porque ficou preso nalguma divisão ;) Quanro ao cão, ele sim, merecia mais que muita gente ;)

 
At 02 junho, 2010 19:58, Blogger Angelica said...

E eu acrescento, tenho saudades do "Pé" da Olá...
Ai saudade!!!!

 

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